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18 de abr. de 2014

05. Inverno, liberdade e Collins


Notas iniciais:
Bomba, para dançar isso aqui é bomba, pra balançar isso aqui é BOMBA! Uh glr, estou bem animada. Eu amo esse capítulo porque COLLINS MEU DEMÔNIO PREFERIDO APARECE NELE! Mentira, eu detesto esse cara.
O dia 284 começou, para Grace, de uma forma diferente. Ao Savannah levar-lhe para o banho e estende-lhe a roupa do dia, ela notou um suéter de lã branco além do tradicional vestido branco, roupa de baixo branca e as sapatilhas brancas, substituídas por botas ¾ brancas. Quando perguntou para Savannah o motivo – não da coloração exclusivamente branca, mas as roupas serem para o clima mais frio do que o de costume – da troca. A cientista-assistente-social respondeu dizendo que o inverno estava começando, resposta que não significou muito para Grace, até, na hora de sua escapada para ver o movimento na rua, ela encontrou Morgan vestida de forma semelhante e girando no jardim da Mansão, como se quisesse abraçar o céu. A ruiva percebeu que Grace a observava, e parou aparentemente envergonhada.
– Bom dia.
– Bom dia Morgan – Grace acenou, não sendo apta a conversar com pessoas além de Savannah – O que está fazendo?
– Ah, isso? – as bochechas de Morgan adquiriram uma tonalidade mais avermelhada do que de costume – É... Inverno.
– Percebi – Grace soltou uma risadinha, talvez a primeira em 284 dias.
– Na casa dos meus tios, nós comemorávamos o inverno, porque a maior parte da nossa família nasceu nele – ela girou os braços novamente – Apesar do frio e tudo mais, é a época de mais liberdade que existe. Para os humanos – acrescentou como se fosse uma informação importante.
– É sempre bom saber que não se é mais humana – Grace murmurou, mas Morgan ouviu, e parou para fita-la.
– Oh, desculpe. Eu a ofendi?
– Não, apenas... Invejo seu modo de pensar, é tão... Otimista – admitiu, dando de ombros – Talvez, por não ter sido criada em uma família, como você, não tenha desenvolvido bem essa capacidade.
– Não exatamente. Fui criada por babás, várias e várias, mas meus pais decidiram que essa não era a melhor solução, ou que uma criança faria mal para as viagens internacionais constantes deles. E me deixaram com meus tios, os Von Pierce.
Von Pierce? – Grace repetiu incrédula – Como, Lauren e Steven?
– Meus primos? – Morgan indagou assustada com o fato de Grace saber o nome deles. – Como sabe?
– É uma... História longa e complicada – lembrou-se da expressão de Savannah quando a apanhou escondida, e do gesto de manter segredo. Savannah podia não ser a melhor pessoa do mundo, mas não valeria a pena mete-la em problemas apenas para explicar algo a Morgan. – Fica para outra vez. De volta à liberdade – fugiu do assunto.
– Os animais perigosos hibernam no inverno, e na época que vivíamos separados por florestas, era uma época boa. Você podia andar livremente no seu vilarejo sem pensar em sofrer um ataque de urso, porque eles estavam dormindo profundamente. Isso é liberdade, sabe? Não se importar com algumas coisas, simplesmente agir como se suas algemas não existissem – ela acenou para os muros visíveis de onde ambas estavam – E com o tempo, elas apenas desaparecem, ou conseguimos fugir delas. Isso é liberdade, Grace.
Uma ideia percorreu a cabeça de Grace, ainda um pouco empenhada em mostrar a Morgan o quão restrita era a sua ideia de liberdade, o quanto de liberdade era proporcionado na Mansão Z. Segurou a garota pelo pulso, puxando-a na direção da rua.
– O que está fazendo? – perguntou Morgan, surpresa pela atitude da outra.
– Essa sua coisa sobre liberdade... Eu gosto de observar às vezes, sabe? – omitiu o “sempre” que estava entalado na garganta.
– Como no dia em que eu cheguei? Eu pude... Ver você.
– Sim – admitiu.
– Pode me mostrar?
– Era o que estava fazendo – Grace tentou sorrir, curvando um pouco os lábios. – Siga-me.
Vou contar-lhe o que dois dos guardas viram naquela manhã. Duas garotas – notavelmente experimentos, pelo fardamento branco que usavam – correndo pelo jardim da Mansão Z de forma mais alegre do que o considerado possível. Uma delas, a mais alta e do cabelo escuro, corria desajeitadamente, tentando seguir o ritmo da risada da outra, mais baixa, com um cabelo ruivo notável até de vista de satélite. Nenhum deles ousou se mexer, reconhecendo as feições magras e desconfortáveis de Grace. As ordens eram conte-la quando necessária, mas a pena para ferir a arma do governo era de morte, e ninguém ali queria tê-la.
As duas plantaram-se sobre o alpendre que havia em todo o comprimento do muro, uma pequena estrutura semelhante a uma coluna, com barras atravessadas, que permitiam a qualquer um colocar os pés sobre elas, como em uma escada. Grace ajudou Morgan a subir, e sobre a luz do sol roxo, rosa e laranja, as duas observaram, em silêncio, o movimento na rua. Inicialmente, eram apenas alguns caminhões apressados, depois, os passantes permanentes – ambulantes, donos de comércios, até mesmo mendigos saindo da fachada das lojas –, poucos homens de negócio, em seus ternos perfeitamente passados, cabelos rigidamente cortados e penteados para trás com gel, levando suas pastas cheias de relatórios e pisando de forma cronometrada com seus sapatos de marca.
Morgan não conseguia entender onde Grace via liberdade naquilo. Em pessoas presas a seus trabalhos, suas obrigações, pessoas para qual o início do inverno significava apenas mudança nas ações, no cumprimento – ou em novas desculpas fajutas – das promessas que faziam para os filhos que queriam esquiar no norte dali a algumas semanas.
– Onde está? – perguntou para Grace em um sussurro quase inaudível, sem desviar o olhar daquelas pessoas.
– O quê? – Grace virou-se para Morgan, sentindo-se um pouco confusa pela pergunta.
– A tal da liberdade. Da qual você falou.
Essa é a liberdade, Morgan. A única liberdade que tive nos últimos meses foi isso – soltou as mãos da estaca presa ao muro, apontando para a rua sem receio de cair – Ver pessoas desperdiçando a liberdade desse modo.
– Livres e presas – a outra murmurou, enquanto o vento forte jogava seu cabelo para trás, para frente, e o prendia no rosto. – Isso é terrível.
– Não, Morgan – Grace soltou-se do muro e olhou firme nos olhos de Morgan – Isso é terrível – gesticulou para a Mansão Z e tudo que nela continha.
Morgan imitou-a, mas, devido à falta de experiência com aquilo, desequilibrou-se, cambaleando um pouco sobre a fina estaca onde estava apoiada. Vislumbrou o chão, imaginando a queda, involuntariamente se inclinando para a queda, quando foi segurada no braço por Grace.
– Foi por pouco – suspirou, com os olhos arregalados. – Eu vi a vida toda passar pelos meus olhos.
– Você teve sorte – admitiu Grace, sorrindo fraco por ter conseguido salvar a vida de Morgan.
– Obrigada Deus – a menor olhou para cima, sem tirar as mãos da barra, temendo uma segunda queda.
– De nada – Grace murmurou, fazendo Morgan explodir em risadas com o pequeno comentário.
Após receberem um sermão em dupla – Savannah e a doutora Hernandez finalmente concordando em algo – e tomarem o café da manhã, as duas foram encaminhadas para mais uma sessão de experimentos.
Uma e meia, Grace pôde ver, na câmara da equipe – que ficava elevada e separada dela, como a sala de médicos durante um exame ou cirurgia –, os agentes do governo, e suspirou pesadamente. Nunca era bom sinal quando eles estavam lá, porque os inexperientes naquilo sempre exigiam o máximo dela. Eles apenas queriam mais e mais, mais potência, mais resultados, mais armas. Qual era o problema daqueles homens? Não entendiam que ela não era uma máquina? Pelo visto, não.
Um daqueles enfadonhos agentes – Grace não conseguia lembrar se era o dos Estados Unidos ou o do Reino Unido, afinal, todos eram cruéis com ela – saiu da câmara de segurança para a área onde ela treinava, discutindo avidamente com Savannah.
– Senhor Collins, creio que não seja seguro fazer isso. Ela não está preparada ainda – argumentava a assistente social-cientista.
– Senhorita Cooper, meu país não está pagando verba para esse maldito programa para que vocês fiquem deixando a arma em uma zona confortável sem evolução – o representante olhou hostilmente para Savannah, que engoliu em seco – Somos uma das maiores potências mundiais, quer mesmo nos ter contra esse projeto?
“Americano” concluiu Grace, “muito presunçoso”.
– Senhor Collins, estamos tendo progresso – Savannah retornou a fala – Ontem, Grace apresentou 10% de progresso em relação ao dia anterior. Poderia, por favor, voltar até a câmara de observação, lá poderá fazer sugestões fora de risco... – ela foi interrompida por uma risada estrondosa e sarcástica.
– Segurança? Minha arma não vai me atacar. Querem que nós confiemos em você, mas não possui confiança o suficiente no seu ratinho de laboratório para me expor, senhorita Cooper? – Grace arqueou uma sobrancelha, já se sentindo brava com aquele representante. Ratinho de laboratório? Quem ele pensava que era? – Agora, de volta ao seu experimento... – ele deu um sorriso malicioso e prosseguiu na caminhada na direção de Grace. – Qual seu nome, garota?
– Grace – grunhiu, estranhando aquele turbilhão de emoções que gritavam na sua mente o que ela era capaz de fazer. Afinal, onde havia se metido seu autocontrole naquele dia?
– Oh, ela sabe falar – senhor Collins deu um riso desagradável, que combinava com suas feições de doninha. – Me diga Grace, consegue levantar um objeto? – Grace assentiu, sabendo que se tentasse falar, não agiria por si mesma, e talvez arrecadaria problemas para Savannah e seu pai. – Responda, garota! – sua voz soou como se Grace recebesse dezenas de chicotadas nas suas costas a cada sílaba. Como ele conseguia fazer aquilo?
– Sim, eu consigo, senhor.
– E pessoas?
– Creio que não, senhor.
– Como assim crê que não? – perguntou incrédulo e virou-se para Savannah. – O que ela está fazendo nos treinamentos? Tomando chá? 10% de progresso, você diz, mas ela progrediu de onde? Do nada? Onde estão os treinamentos, senhorita Cooper?
– O ritmo de Grace é relativo com o passar dos dias, senhor. Se lesse nossos relatórios...
– Ah, por favor, cale a boca, Savannah – retrucou-a. – Pelo visto, você não aprendeu nada com a SIS, não é mesmo?
– SIS? – Grace perguntou curiosa, ao passo de que Savannah arregalou os olhos como se houvesse levado uma punhalada no coração.
– Não é nada, Grace – a cientista cortou o representante, fuzilando-o com o olhar. – O senhor Collins está tendo alucinações.
– Silêncio – ordenou o outro. – Mostre-me o que sabe, Grace, e Savannah, nada de proteger a inútil.
Grace estreitou os olhos, sentindo mais fúria do que nunca ouvira antes. Savannah ajudara a enclausurar e a destruí-la mentalmente, mas também havia a protegido, ela sabia disso, só não como. Não deixaria que aquele homem ridículo a tratasse daquela forma. Havia os segredos, mas não importava agora.
Além do mais, a garota já estava cheia do homem do governo.
Colocou a perna direita para trás, concentrou-se, fechou os olhos, e simplesmente aconteceu. Em instantes, o senhor Collins estava berrando e esperneando, suspenso no ar. Alguém na câmara de observação gritou algo, e antes que Grace percebesse, estava recebendo choques que faziam todo seu corpo tremer. Aquilo a desestruturou totalmente, fazendo-a cair no chão, e com que sua mente soltasse o representante, que caiu no chão, inconsciente. Savannah olhou de um jeito triste, pesado e decepcionado, como se Grace houvesse colocado o último prego no seu caixão.
Mais tarde, quando passou pelo mesmo lugar onde desmaiara no dia anterior, Grace ouviu o senhor Collins gritando com Savannah, na verdade, ameaçando-a. Ele voltara a falar sobre a tal SIS, e a expressão no rosto da cientista a cada vez que o nome era mencionado era como se ela recebesse choques piores do que os de Grace. Por fim, a garota decidiu que já arranjara problemas o suficiente e voltou para a biblioteca, onde encontrou Morgan afundada em um livro.
– Olá Grace – a ruiva sorriu – Desistiu de fugir?
– Na verdade, preciso de você – admitiu, dando de ombros. – Quero que me ajude a encontrar, nesses livros, qualquer coisa relacionada a SIS.
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Pela noite, Grace ouviu batidas na porta do seu quarto. Savannah havia acabado de sair, o que poderia ser?
– Entre – a garota falou, mesmo sabendo que, quem quer que fosse, entraria, de qualquer forma.
– Você arrumou uma encrenca hoje – Savannah disse, passando direto para o colchão de Grace. – Mas gostei da sua atitude.
– Você veio aqui me dar outro sermão? – Grace perguntou timidamente.
– Na verdade, vim informa-la que ganhou uma colega de quarto.
– Morgan? – Grace perguntou surpresa, arregalando os olhos, e Savannah deu um meio sorriso.
– A pior punição que Collins conseguiu para você foi que dormisse no mesmo lugar que uma infectada – um brilho jovial passou pelos olhos da cientista. – Eu não deixaria que ele maltratasse a minha garota, é claro. Mas precisa ser mais cuidadosa, Grace. Agentes do governo não são como os guardas da mansão, dos quais você pode fugir apenas ficando invisível – lançou um olhar de acusação pelas fugas para Grace, que sorriu timidamente. – Principalmente um dos Estados Unidos, pelo amor de Deus!
– Isso significa que não estou encrencada? – arqueou uma sobrancelha.
– Não mais do que o normal – admitiu Savannah. – Vou chamar a doutora Hernandez, para que ela traga Morgan. Sabe que pode me chamar quando quiser.

Naquela noite, Grace dormiu ouvindo Morgan murmurar sobre liberdade, livros e os mistérios da Mansão Z. Será que havia, finalmente, conseguido uma aliada, em meio aos cientistas, psiquiatras e médicos assustadores do lugar?
Notas finais: Eu escrevi esse capítulo após assistir Ginger & Rosa, e devo confessar que o filme mexeu com minhas ideias. Espero que tenha gostado desse capítulo, porque eu gostei demais, já que Morgan participa mais da história do que eu planejava. Inicialmente, ela era apenas uma secundária, mas com esse capítulo, ela praticamente me forçou a coloca-la no páreo. Ok, vou parar de ladainha. Tchau.

2 comentários:

  1. Parece ser perfeito (ainda não li), mais se eu ler, é impossível não gostar!
    http://g-oldencastle.blogspot.com.br

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  2. Boa tarde kalyn.. capítulo muito bem escrito, não muito longo como se v~e e como eu tb coloquei para mim na história que estou fazendo de não deixar nada muito grande..
    muita nitidez nas conversas, eu apanho muito pq sou mais de fazer sonetos, mas um dia me acho.. espero que registre e futuramente d~e vida a isto.. bjs e um lindo dia
    lapidandoversos.blogspot.com.br

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